12 Anos de Escravidão | Quando um filme deixa de ser apenas um filme.



Por Luiz Alexandre


12 Anos de Escravidão 
Título original: 12 Years a Slave 
Direção: Steve McQueen 
Gênero: Drama 
Ano: 2013 
Nacionalidade: EUA 
Tempo: 2h13min 
Sinopse: 1841. Solomon Northup (Chiwetel Ejiofor) é um escravo liberto, que vive em paz ao lado da esposa e filhos. Um dia, após aceitar um trabalho que o leva a outra cidade, ele é sequestrado e acorrentado. Vendido como se fosse um escravo, Solomon precisa superar humilhações físicas e emocionais para sobreviver. Ao longo de doze anos ele passa por dois senhores, Ford (Benedict Cumberbatch) e Edwin Epps (Michael Fassbender), que, cada um à sua maneira, exploram seus serviços. 

O cinema em sua essência é um veículo de entretenimento. Amigos e familiares podem se divertir por horas e horas com filmes de diversos gêneros e gostos, mas no decorrer da história, o cinema foi ganhando novos usos seja como propaganda, para uso político ou para fazer denúncias. Por vezes surgem filmes que aliam o entretenimento com denúncias sociais, entretenimento com reflexão. Por vezes surgem filmes que entram para história, pois não morrem ao final da exibição, filmes que deixam de ser filmes como é o caso de “12 Anos de Escravidão”. 

A história de Solomon Northup que não é tão conhecida por nós – pelo menos não era – encontra-se narrada no livro “12 Anos de Escravidão” e desde sua redescoberta em 1968 é um dos livros mais importantes para os estudos da escravidão na América do Norte. O filme de Steven McQueen é baseado neste livro que fora lançado em 1853 tornando-se um best-seller ainda neste ano. 

No livro, assim como no filme, Solomon Northup é um negro nascido livre, pai de família, um homem culto e bem sucedido que morava em Nova York. Em 1841, recebeu uma proposta de emprego devido a suas habilidades como músico. Viajou até Washington, onde a proposta de emprego acabou logo se revelando como um verdadeiro golpe. Solomon foi sequestrado, enviado para o Sul dos Estados Unidos e lá vendido como escravo. Passou por diversos donos até que um dia conseguiu enviar uma carta para seus amigos e familiares denunciando sua situação. Solomon Northup enfiam foi resgatado... 12 anos depois do seu sequestro. 

Geralmente quando um livro é adaptado para o cinema, muito da experiência original da história perde-se por um lado, mas pode ganhar um olhar novo ao ser transporto para uma mídia diferente como o cinema. Steven McQueen tem o mérito de transpor essa história para a telona captando os aspectos mais importantes da história de Solomon Northup, nos fazendo refletir sobre uma época vergonhosa para a humanidade. 

Steven McQueen

A escravidão é uma prática de trabalho bem antiga e transposta para a América no contexto das Grandes Navegações. Falando de escravidão nos Estados Unidos, a história de Solomon Northup nos dá uma ideia de como funcionava esse sistema de escravidão, onde de um lado - o norte – um negro poderia gozar de prestígio - e de outro – o sul – não lhe restava muitas opções a não ser aceitar ser subjugado pelo senhor de escravos. 

“12 Anos de Escravidão” chama a atenção por ser um filme que toca num assunto que é pouco recorrente no cinema norte-americano. Também por ser contundente em revelar aspectos daquela época. Seja a forma como os escravos eram tratados, pais que eram separados de seus filhos, a violência imposta aos escravos e a justificação bíblica usada para legitimar a escravidão e os castigos mais pesados sobre os escravos. O filme choca os mais sensíveis em suas cenas mais fortes, mas emociona aqueles que simpatizam com a história de injustiça cometida contra Solomon Northup. Mas não esqueçamos que a história de Solomon é uma entre milhares de histórias de seres humanos que sofreram sob o jugo da escravidão e que muitos não encontraram a liberdade e morreram sem encontrar a justiça. 


O filme torna-se emblemático na discussão sobre a escravidão na América do Norte. Hoje o filme tem despertado debates nos Estados Unidos e mais recentemente foi incorporado ao currículo das escolas do país. Montel Williams, porta-voz da National School Boards Association, revelou: “quando Hollywood faz o seu melhor, o poder do cinema é transformado em uma poderosa ferramenta educacional. O filme mostra uma época vergonhosa da história americana e, assim, evoca os estudantes o desejo de não repetir os erros do passado e os inspira a sonhar com um futuro melhor”. 


O filme de Steven McQueen é um grande sucesso de crítica e publico sendo o grande vencedor do Oscar 2014 na categoria de melhor filme. Para muitos críticos, esse prêmio revela um grande avanço nas premiações do Oscar sendo um marco histórico. Pela primeira vez, um filme dirigido por um cineasta negro leva um prêmio de melhor filme. No discurso de vitória, McQueen dedicou o Oscar “a todos que merecem não só sobreviver, mas viver. Esse é o grande legado de Solomon. E a todos que sofreram com a escravidão e ainda hoje sofrem.” 


A importância que “12 Anos de Escravidão” estar em não morrer depois ser visto. O filme não acaba ao final da sessão. Ele continua nos debates que vem gerando, dessa forma o filme deixa de um filme e passa a ter importância ao trazer para a atualidade o debate sobre o papel da escravidão na sociedade norte-americana. Debates como esses também podem e devem ser trazidos a nossa realidade brasileira seja em seminários, convenções e na sala de aula. Discutir os crimes do passado para se evitar os mesmos crimes no presente. A escravidão das época coloniais hoje é assunto nos livros de história, mas a escravidão na forma como hoje se constrói em pleno século XXI deve ser alvo de debates mais contundentes e procurar justiça para aqueles que foram distanciados de um dos maiores direitos do ser humano: a liberdade.

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